Sumário
Vim fazer uma visita à Delegacia da Mulher, nesta quinta-feira (5), às 20h, em Goiânia. Chega uma jovem com o nariz e os lábios arroxeados de sangue já escorrido poucas horas atrás.
O namorado, há seis anos em relacionamento estável (será?), é um armamentista. Orgulhosamente com o seu certificado de registro CAC em dia. Embebedou-se e, a partir daí, abriu a gaiola que enjaulava seu monstro interior.
Agressivo e explosivo, ameaçou a companheira. Não era a primeira vez. Ela, assustada, sacou o celular, como forma única de se proteger, e começou a filmá-lo. “Eu vou filmar, pra você poder ver como você fica quando bebe”.
O selvagem ensandeceu-se! Abriu uma gaveta e sacou a arma para potencializar sua sanha e impor terror sobre a moça acuada. Avançou irado para ela, que se viu esmagada na esquina de duas paredes de sua casa.
Com o revólver em punho, decidiu por usar o instrumento que lhe há de mais duro: a cabeça.
O osso protuberante de sua testa arrebentou a cartilagem da narina esquerda da companheira. A cabeçada grotesca selara o destino do desenvolvedor de software, perfil nerd, tipo pacato.
“Nunca achei ele muito normal”, relatou-me a cunhada.
Entre os vai-volta do relacionamento, que deu sinais claros de perturbações, em outros surtos paranoicos de ciúmes imaginários, do alcoólatra, finalmente a história terrível se encerrará na cadeia.
Quando questionada pelo atendente da delegacia: “A senhora vai querer entrar com medida protetiva?”. A moça titubeou balançada por um segundo, e eu, comovido, antecipei por ela a resposta: — Vai sim!
As duas olharam para mim, agradecidas.
A menina está grávida. 12 semanas. Passou a morar com o genitor do seu filho em função da situação. Não durou dois meses juntos, sob o mesmo teto, para que o intensíssimo espelho do convívio a dois refletisse as assustadoras verdades do caráter humano.
O policial, que atendeu a ocorrência, passou ao meu lado conduzindo o agressor. Antes de entrar no corredor que dá acesso às grades, a fera algemada olhou friamente, uma última vez, para a causadora do seu infortúnio…
Por que eu estava na delegacia? Minha mulher e eu acompanhávamos uma amiga, muito querida, na sua difícil coragem de mudar, para sempre, a sua vida.
É que, amanhã, outro monstro amanhecerá notificado sobre sua conduta. E quem sabe, certamente pela caneta de um bom juiz, a paz poderá bater — desta vez um pouco mais duradoura —, no peito de uma mulher.