Uma consequência técnica possível, de se traduzir o termo alemão Seele (alma, como usado por Sigmund Freud), por mente, conforme acontece por exemplo na Standard Edition, a tradução britânica padrão de seus trabalhos analíticos, é a de se ter uma visão de algo que mentaliza; se delineia, e pode ser objeto de estudo científico.
A alma freudiana tem de também ser passível de tornar-se objeto de estudo poético; não é algo que mentaliza, que obsessivamente concentra, organiza, edita... Mesmo que tais aspectos façam parte da sintomática do paciente obsessivo, dentre outros; a alma freudiana, no além da consciência, em seus planos mais profundos, autênticos e prenhes de possibilidades semânticas, por exemplo - como o sonho ou o chiste, condensa e desloca, metaforiza e nos assombra por meio de metonímias, criando uma gramática (no senso de [re]estruturação idiomática) e uma poética (capacidade de criação discursiva que remete, inclusive, às aventadas metáforas e metonímias, mas que pode atentar-se ainda à onomatopeia, e demais figurações da língua) que fundamentam a associação livre, porquanto, em suas mais variadas incidências.
A mente obsessiva e de cunho estritamente laboratorial apaga a produtiva histericização da alma e, como sabemos, para que haja análise, é fundamental que o discurso se histericize. Ora, a escuta também; a histericização da escuta possibilita as intervenções mais espontâneas, as delícias ou intensidades do insight que se apresenta mediante a figura do analista, deixando que este de supetão intervenha, sempre obtendo em conta o profissionalismo, em todo caso; mas propiciando, mesmo que no atendimento do obsessivo, que a alma apareça, e sua análise, desse modo, possa acontecer e se adensar; na expressão e escuta clínica, assim sendo, acerca de seus afetos tão árduos de vir à luz.
O clínico da ideia obsessiva de mente pode ficar com a escuta tapada para a intensa gramático-poética da alma, se na tradução de Freud que consulta e frequenta, tal ideia é posta como conceito essencial da psicanálise, em decorrência de seu labor de prática teorizada; fazendo-o imaginar, nesses quesitos, uma "sóbria" clínica da mente.
Trata-se, antes, de com Édipo, Antígona, Hamlet ou Fausto, aceitar o trágico-absurdo dessa alma de Erínia, que assola o sujeito do inconsciente, e salpica nossos consultórios com sua fala (ou, ao menos, possibilidades de fala) a circular em torno do caos, ou princípio primário - da "bruxa"; como Freud já se referiu à sua metapsicologia. Esta, aliás, faz-nos lembrar das três bruxas de Macbeth, associáveis às três trágicas Moiras gregas.