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“O Redemoinho da Imprensa”, impressões de leitura

Desembargador Itaney Francisco Campos, presidente da Comissão Cultural do TJGO, publicou um artigo no jornal Diário da Manhã, sobre o livro do poeta Gabriel Nascente, que faz um tributo ao jornalista Batista Custódio

Jornalista Batista Custódio, personalidade legendária da imprensa goiana, é o objeto de homenagem pelo poeta Gabriel Nascente no seu livro O Redemoinho da Imprensa

Sumário

Capa do livro e o seu autor, poeta Gabriel Nascente

Numa clara manhã de sexta-feira, no verão do ano fluente, me liga, eufórico como sempre, o poeta Gabriel Nascente: “Saiu o livro do Batista. Estou indo a sua sala, levar-lhe um exemplar!” Minutos depois, chega o poeta, lépido, leve e despachado, e me agracia com um volume de “O Redemoinho da Imprensa”, um tributo poético ao jornalista Batista Custódio, fundador dos jornais Cinco de Março e Diário da Manhã. Esse esclarecimento vem à guisa de subtítulo, entre parênteses, na capa do livro.

À noite, em casa, ao entregar-me ao prazer da leitura dos textos poéticos, constato que a coletânea, mais que um tributo, mereceria ser denominada “oferenda”, ou “louvação”, no melhor sentido do termo, porque é o reflexo do olhar amoroso e profundo do poeta sobre a atividade e o perfil humano do jornalista homenageado.

A figura polêmica de Batista Custódio, célebre por seus editoriais incandescentes, revela-se em suas várias dimensões, ora plúrimo, ora frágil, ora luminescente, ora tempestuoso. Mas sempre surpreendente e apaixonado pelo seu ofício. E o poeta, que o contempla admirado, recorre a imagens e metáforas na tentativa de descrever o trovejante jornalista: vulcão, profeta, poeta, furacão, velho urso são alguns dos epítetos utilizados.

Parte de sua trajetória existencial o poeta a perfez ao lado do veterano homem da imprensa, ora como fiel escudeiro, ora como amigo e confidente, mais do que repórter e articulista. Foi testemunha privilegiada dos diatribes, erupções e ousadias do jornalista.

Não bastasse traçar o perfil do homem vigoroso e editorialista talentoso e controvertido que foi (e é) Batista Custódio, o livro de Gabriel registra um tempo de “inescrutável melancolia”, “tempos de caçadas aos menestréis das noites”. Uma página sombria na história política brasileira, quando a ditadura militar quis converter a nação em um imenso quartel. A poesia erige-se como um libelo contra o regime de terror, anotando que “as tropas de choque amordaçavam a liberdade no coração dos praças”. E mais: “As livrarias, a escolas, os botecos, as universidades, as igrejas e os bares acolhiam os amotinados no calor de seus afagos. O motim estava solto e paria seus demônios.”

Nessa quadra de domínio das botas e baionetas, quando pensar já era perigoso, o inevitável aconteceu: Batista foi encarcerado. O poeta sangra e produz uma sequência de poemas duros, ásperos, panfletários, sob títulos explícitos: “Nós, o jornalismo e a ditadura”, “O horror de capacete”, “Fedor de pólvora”, “As lágrimas do calabouço”, “Os túmulos da liberdade”, além de muitos outros, engajados e denunciantes, verdadeiros poemas - libelos. “É um tempo de esperanças destroçadas”, anota o escritor.

Ameaçado em sua própria sobrevivência, testemunhando o encarceramento e o exílio dos seus pares, o poeta registrava: “Um zumbido de cigarras / ecoava triste / pelos matagais da minha alma.”

Mas nem tudo é tragédia. Há instantes luminosos nesses depoimentos amorosos. O convívio do poeta e do jornalista com a natureza, no sítio do Encantado, reflete-se em poemas de delicada tessitura, reveladores da intimidade da poesia com os elementos da natureza, sobretudo o rio, os peixes, a mata e o próprio espaço rural.

Nesse meio, o velho jornalista é quase um profeta, um grande animal dominador, mas harmônico, e, o poeta, seu irmão menor, um aprendiz, que o acompanha mata adentro, fascinado com o périplo intemerato do seu guia.

Esses são os momentos mais líricos do livro, em que se entreveem dois homens livres, simples, insertos na natureza: um deles racional e pensante; o outro, lírico e sonhador. É como se reconstruíssem o jardim do Éden. Mas do lado de fora já se alimentavam os corvos e se preparava a pólvora dos canhões. Dias sombrios se anunciavam nos céus da pátria.

O livro de Gabriel Nascente descreve, com as tintas da poesia, os laços de uma amizade atemporal, um ciclo de medo e esperanças naufragadas e momentos de idílio vividos no interior da natureza de Goiás. É um livro para se sofrer, mas também para se extasiar e desfrutar, ante o refrigério de sua lírica.

Itaney Francisco Campos, membro da União Brasileira de Escritores - Seção Goiás, associado do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás. Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás

Publicado 26 de fevereiro de 2016, no jornal Diário da Manhã
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