Saí de Posse, a 520 quilômetros, para a última despedida a Batista Custódio, mercê de uma amizade de mais de meio século, e eu, numa militância de esquerda de igual tempo, passando pelas cadeias políticas de 64, muitas, militando no PMDB por estratégia e pelo coração na clandestinidade do glorioso PCB.
Tanta peleja, tanta esperança e tanto sonho para ver a direita sem honra, homofóbica, misógina e violentíssima tomar conta do parlamento brasileiro. Pelo voto. Triunfar na Argentina. Também pelo voto.
E o braço criminoso dessa direita é a barbárie, a negação da ciência, o terraplanismo e o patati-patatá de pastores protestantes estuprando a fé de incautos e tomando-lhes o derradeiro tostão e o voto.
Nesta sociedade agropecuária, em que o agro representa a nossa cultura, cultura da terra vermelha tingida pelo sangue de camponeses desarmados, cultura do grilo, cultura do feminicídio, de que o deputado Zé Trovão, espancador de mulheres, analfabeto de pai e mãe, é o PhD da classe, chegando essa voz tonitroante, à procura de um cérebro, até a criticar o Enem... Aqui, o agro primitivo, quase primata, vai além...
Mas voltemos ao jornalista Batista Custódio. Seu corpo foi velado no Cemitério Jardim das Palmeiras e enterrado no Santana, em Campinas. Lá estava a sua família: dona Marly, a viúva. O advogado Lázaro Custódio, entre todos os irmãos, sempre foi o mais chegado a Batista. Os filhos: Júlio Nasser, Imara, João do Sonho, Maria do Céu e Previsto, o irmão mais novo.
Batista nunca foi comunista. Não era de direita, nem de esquerda, e ele mesmo se definiu: “Sou um livre pensador numa república de debochados”.
Por opção, Batista era um homem pobre porque, honesto, se recusou a ser rico. E ao fim da vida chegou a viver d’amigos. Polêmico e frasista inimitável, Batista dominava o assunto e dizia: “Ele é tão pobre que precisa de dinheiro para ser feliz”.
No Jardim das Palmeiras, Batista foi velado por autoridades, com a presença do governador Ronaldo Caiado e de Marconi Perillo, quatro vezes governador.
Durante mais de duas horas, Caiado permaneceu de pé à beira do caixão ouvindo longos discursos. O de Arthur, filho de Batista, foi bom, e os outros... nhem... nhem... nhem... e tome discurso... e o governador esperando.
Uma cantora, morenaço bonita, roubou a cena ao cantar “Pra não dizer que não falei de flores”, de Geraldo Vandré, o chamado Hino dos Comunistas. E sua voz afinada encheu a sala velatória: “Nos quartéis lhes ensinam antiga lição/ a morrer pela Pátria e a viver sem razão. Vem, vamos embora...”
E um curioso jura que o governador acompanhou a música ao compasso do pé.
Sentado lá atrás, sozinho, Marconi Perillo esperava pacientemente o traslado do caixão. Poucos, pouquíssimos foram cumprimentá-lo. E muitos dos que fingiram não vê-lo comeram a tripa forra em seus quatro governos.
Por volta das 10 horas, o caixão foi retirado. O governador Ronaldo Caiado pegou em uma das alças da cabeceira, e Marconi pegou em outra alça, bem mais atrás, lá atrás.
No Cemitério Santana, o povão tomou conta do esquife com alguns discursos. O mais notável deles foi o do ex-deputado Tarzan de Castro, que falou como testemunha presencial da fundação do “Cinco de Março”, semanário que protagonizou o mais forte capítulo da imprensa goiana.
O corpo de Batista baixou à sepultura ao som da mesma voz da morenaço, uma cantiga romântica, como romântica foi a vida do morto.