Sumário
Na manhã da terça‑feira, 10 de junho de 2025, a Escola SESI de Referência de Rio Verde foi oficialmente nomeada Escola Antônio de Sousa Almeida, em homenagem ao empresário e líder sindical que marcou gerações no setor gráfico e industrial goiano. A solenidade, conduzida pelo presidente da Fieg, André Rocha, reuniu diretores do Sistema Indústria, autoridades municipais e membros da família Almeida – que, após 57 anos, retornam a Rio Verde para o momento de reconhecimento e emoção.
O vice‑presidente da Fieg por décadas, Antônio de Sousa Almeida (falecido em agosto de 2020), deixou legado pautado na responsabilidade social, no estímulo à cultura e na valorização da mão de obra local. Foi sob sua liderança que a gráfica familiar Pirâmide Artes Gráficas evoluiu para a Editora Kelps, referência no Centro‑Oeste, com mais de 50 mil títulos publicados e uma produção ininterrupta que desafia ondas e crises do mercado.

Um dos ponto altos da cerimônia foi a leitura da carta‑homenagem escrita por Leandro Almeida, filho do homenageado e atual presidente da Editora Kelps. No texto, Leandro narra as raízes familiares desde a chegada dos primeiros barões portugueses ao sertão e descreve, com profundo afeto, as dificuldades enfrentadas pelo pai na roça, a fundação da gráfica no quintal da casa dos avós e a consolidação da Editora Kelps após um “neologismo acidental” no nome. A correspondência, repleta de memórias íntimas, traça um panorama humano que transcende datas e números, reafirmando que Antônio “segue vivo em nós”.
A secretária‑geral da Fieg, Luciana Machado Martins, e o ex‑presidente da Fieg Jovem, Leandro Almeida, destacaram que a denominação da escola simboliza não apenas o reconhecimento institucional, mas a perpetuação do espírito de inovação e solidariedade que Antônio sempre imprimiu ao setor. O prefeito de Rio Verde, Wellington Carrijo Filho, enalteceu a contribuição do empresário ao desenvolvimento regional e ao agronegócio, ressaltando que a unidade escolar agora servirá de memória viva para as futuras gerações.
A viúva Uilma Rodrigues Almeida emocionou os presentes ao lembrar o amor do marido pelos livros e pelo Sistema Indústria, enquanto as netas e sobrinhos de Antônio reforçaram a importância de manter aceso o legado de união familiar e empreendedorismo. “Cada um cumpriu seu papel, gerou frutos. Tudo fez sentido. Ecoou além do tempo”, encerrou Leandro Almeida, em nome de toda família.
Leia a carta na íntegra

Destinatário: Antonio de Sousa Almeida
Pai,
Escrevo‑lhe esta carta para lhe contar algumas novidades. Estamos de volta à sua terra natal, Rio Verde, após 57 anos de exílio. Mas antes, preciso lembrar de algumas coisas — daquelas histórias que não são contadas, que não estão no currículo — e declarar que o senhor segue vivo em nós.
Lembro‑me de você dizer que, quando criança, com apenas 7 anos de idade, havia duas opções: a primeira era ir para a roça plantar, capinar ou fazer qualquer outra tarefa; ou então, ficar na sede da fazenda para mais tarde levar o almoço a cavalo para quem estivesse na roça. Porém, você sempre preferia ficar na roça.
Hoje fecho os olhos e imagino você com a idade do seu neto Benjamim: pegando na enxada, na foice, no arreio do cavalo. Imagino o quanto deve ter sido doloroso, a quantidade de calos nas mãos, trabalhando de sol a sol, o choro engolido da criança que só podia olhar para a paisagem e contemplar a natureza como fuga daquela situação. Digo‑lhe: valeu a pena.
Hoje estou aqui porque muitos caminharam antes de você.
Antônio de Sousa Almeida é o sonho de pessoas que viveram muito antes daquele 16 de janeiro de 1951, o seu natalício. Os irmãos Antônio e Pedro de Barros, oriundos do Algarve, no sul de Portugal, nos idos de 1600, chegaram à vila de São Vicente a serviço da Coroa Portuguesa, onde prestaram relevantes contribuições ao desenvolvimento da capitania de São Vicente. Deixaram suas marcas.
Seus descendentes seguiram o curso da colonização, entradas e bandeiras de povoamento do Brasil e seus vastos sertões até chegarem ao antigo Arraial de Nossa Senhora das Dores de Rio Verde, atual cidade de Rio Verde. Filho de João Balduíno de Almeida, nascido em 11 de janeiro de 1927, na fazenda Boa Vista, e Joana Rosa Barros, nascida em 6 de agosto de 1929, na fazenda Córrego da Lage. Há que se reconhecer uma geração anterior, os avós, tão importantes nesta jornada. Avós paternos: Manoel Ildefonso de Almeida e Honora Balduíno de Souza; e avós maternos: José de Souza Barros e Maria Rosa de Oliveira. Plantaram sementes.
Agradeço aos que abriram caminhos. Sei que ocupo um lugar construído com esforço, coragem e entrega.
Os tios, tão presentes e importantes em nossas vidas: relato aqui os tios paternos Lívia de Almeida Souza (Tia Nenê), Maria Joana Balduíno (Tia Duca), Antônio Manoel Almeida (Toim) e Afonso Balduíno de Almeida. Tios maternos, muito numerosos: Lázara Souza Barros, Juvenil Souza Barros, Uracides Oliveira Barros, Geraldo Souza Barros, Jerônimo Souza Barros, Arlinda Oliveira Barros, Anercídio Souza Barros, José de Souza Barros Filho, Veleriano de Souza Barros, Isoldina Marques Barros, Teobaldo Souza Barros, Sebastião Oliveira Barros, Alcides Souza Barros, Humberto Oliveira Barros, Francisco Souza Barros.
Houve muito suor, lágrima e sangue derramados nesta terra.
Meu avô João Balduíno de Almeida dizia sobre a vida na roça: "O homem que leva essa vida tem que implorar a Deus, antes e depois da plantação. Primeiro, para chover e, depois, para conseguir fazer uma boa colheita. Então, quando chega a hora de vender, o produto se desvaloriza e, muitas vezes, nem compensa o investimento e a mão de obra."
E por conta disso, com seus irmãos Raymundo Barros de Almeida, Ademar de Almeida Barros, Maria de Fátima Almeida, Maria Regina de Almeida, José de Almeida Barros, Waldecy de Almeida Barros, Lázara Maria de Almeida e Vanderlan de Almeida Barros, vocês foram para Palmeiras de Goiás.
Vocês saíram daqui em um tempo muito difícil, em busca de novas oportunidades.
Em Palmeiras encontrou o amor da sua vida, Uilma Rodrigues Almeida, com quem casou e teve o primeiro filho, um anjinho que, com poucas semanas, o Senhor levou para morar no céu. Foi por uma razão maior. Pouco tempo depois nasceu Dennia de Sousa Almeida, que trouxe muita preocupação, mas logo se revelou uma benção em casa.
Continuando esta jornada, você se mudou para a capital em busca de novos trabalhos. Inquieto que era, foi para Suzano, interior de São Paulo, conquistar seu espaço de reconhecimento em uma grande indústria. Essa foi a época em que eu nasci — um paulista com alma goiana.
Mas nesse mesmo período aconteceu o pior, o impensável: o irmão mais novo, Vanderlan, faleceu em um trágico acidente de carro na rodovia. Cumpriu seu papel.
Com o ímpeto de reunir a família, você não pensou duas vezes em abandonar o excelente emprego da época com o propósito de juntar a família novamente, que estava esparramada, cada um para um canto. O pretexto para tal feito foi montar uma gráfica no quintal da casa dos pais, com o irmão Waldecy, que era gráfico. Logo também se juntaram Ademar e José.
Foi um período de muita dificuldade: não havia mais o excelente salário, e as quatro famílias viviam das poucas vendas dos serviços gráficos que tinham na época. Uma vida regrada e escassa, mas com garra, determinação e coragem, seguiram adiante.
Assim surgiu a Pirâmide Artes Gráficas que, em pouco tempo, com sugestão de amigos escritores, deu origem à Editora Kelps.
Na verdade, era uma homenagem à Grande Pirâmide do Egito, Queóps, mas, por erro do contador, virou Kelps. Como toda boa história carrega um toque de poesia, surgiu como um neologismo acidental. E ficou. Assumimos a licença poética, porque nomes também têm alma, e esse passou a representar uma trajetória de livros, autores e sonhos que fazem parte da nossa história.
E hoje te afirmo que a Editora Kelps é uma das maiores casas editoriais do país. Ajuda milhares de autores a realizarem seus sonhos, expandimos fronteiras e concorremos com gráficas e editoras de todo país. Enquanto vejo gráficas com máquinas paradas, a nossa tem serviço para pelo menos três meses de produção ininterrupta. É uma empresa pungente, próspera e comprometida com o cliente.
Podemos falar agora um pouco da sua história que todos conhecem: sua contribuição para a cultura, para a sociedade e para o meio empresarial. Sei que não lembrarei de todas aqui, mas você foi apaixonado e dedicado: projetos culturais, Bienal do Livro, concurso de poesia, Literatura do Futuro, patrocínios, permutas, edições consorciadas, livros, literatura, poesia, doações, Xeroderma Pigmentoso, Sindicato das Indústrias Gráficas, FIEG, SESI, SENAI e aqui cabe um “etc.” por todas as suas contribuições que vão muito além.
Ficou marcado sua contribuição sindical. Atuou fortemente para a consolidação da indústria gráfica goiana através do SIGEGO, contribuiu com a FIEG e o Sistema S desde José Aquino Porto, passando por Paulo Afonso Ferreira, Pedro Alves de Oliveira e Sandro da Mabel Antônio Scodro.
Nenhuma dessas paixões se comparavam com a pescaria, aliás você dizia que não gostava de pescar pois só pescava aos sábados, se realmente gostasse iria todos os dias. Gostava muito quando perguntava para as pessoas se conhecia o rio Araguaia, e se a pessoa respondesse que não, você logo emendava: você perdeu a metade da sua vida, conheça e recupere o restante que falta.
Sua família cresceu em unidade. Vieram a nora e o genro: Derbby Thayse Pereira e Silva Almeida e Elismar José Ferreira. Depois nasceram os netos: Yago Bento Ferreira Almeida, Bernardo Gabriel Pires Almeida e Benjamim Lucas Pires Almeida. Que família feliz você conquistou.
Tomamos um baita susto em 2020, quando descobriu o câncer. Foi muito rápido. Mas Deus quis assim? Não. Você quis assim.
Na nossa última conversa ao telefone, eu disse: “Pai, pode ficar tranquilo. Não se preocupe com nada aqui fora. Estou tocando os negócios aqui com os tios, está tudo bem.” E você me respondeu: “Eu tenho certeza que você consegue. Estou tranquilo.” E, naquela mesma noite, você se entregou aos braços do Senhor. E aconteceu como você sempre planejou: dizia que duas horas de última despedida eram suficientes. Não era para esperar ninguém. Aliás, nem poderíamos pelas restrições da época.
E como não reconhecer Deus em todos estes momentos?
Hoje estamos aqui. Você, teria 74 anos, e o vô João 98 anos, retorna a Rio Verde, agora uma cidade pungente, próspera e uma das mais importantes do agronegócio brasileiro, que reescreve sua história e reconhece aquele que um dia foi exilado e hoje é repatriado, honrando todo o suor, toda a lágrima e todo o sangue que fora derramados um dia por você e pelos nossos antepassados.
Pai, Toin da Kelps, o mecenas da cultura, líder, presidente, empresário. Tudo teve propósito. Foram deixadas marcas. Cada um cumpriu seu papel, gerou frutos. Tudo fez sentido. Ecoou além do tempo. Foi por uma razão maior. Valeu a pena. Não se perdeu no tempo. Segue vivo em nós. Virou raiz.
Agora, nossa família pode seguir em paz e harmonia, e continuar este legado.
Gratidão a todos.
Leandro Rodrigues Almeida, em nome de toda a sua família que te ama e sente muitas saudades.
